O que são micotoxinas

As micotoxinas são substâncias que contaminam os produtos agrícolas, causando danos ao longo da cadeia alimentar e produtiva, com impacto direto na saúde animal. A sua existência é um fator importante a ter em conta na produção animal.
As micotoxinas são metabolitos secundários tóxicos, produzidos por diversas espécies de fungos, como sejam Aspergillus, Penicillium e Fusarium. Estes compostos químicos não são essenciais para os processos metabólicos básicos dos fungos, mas contaminam os produtos agrícolas, constituindo um risco significativo para a saúde e produtividade dos animais, bem como para a saúde humana, através do consumo de produtos de origem animal e vegetal.
O desenvolvimento de micotoxinas ocorre naturalmente e pode contaminar as culturas agrícolas durante o crescimento, a colheita, a armazenagem, o transporte ou o processamento, sendo substâncias muito resilientes, que podem manter a sua toxicidade mesmo após o fungo que as produziu ter perdido a sua viabilidade.

A indústria alimentar está há muito tempo consciente da presença de fungos nos alimentos, mas este tópico tem ganho cada vez mais importância, à medida que se compreende a sua disseminação e os seus potenciais impactos na saúde.
Entre as culturas mais afetadas pela presença de micotoxinas podemos encontrar o trigo, o centeio, a aveia, a cevada, o arroz e o milho, que constituem a principal fonte de energia para a alimentação, tanto de animais como de humanos.

Fatores favoráveis ao desenvolvimento de micotoxinas

Há diversos fatores que contribuem para o desenvolvimento e proliferação de micotoxinas:

  • Condições ambientais: a temperatura e a humidade são fatores críticos. Climas quentes e húmidos favorecem o crescimento de fungos produtores de micotoxinas e as culturas expostas a estas condições durante a época de crescimento incorrem num risco acrescido de contaminação;
  • Práticas agrícolas: práticas agrícolas desadequadas, como sejam uma deficiente rotação de culturas, o uso excessivo de fertilizantes ou o atraso nas colheitas, podem aumentar a suscetibilidade das plantações à infestação por fungos;
  • Condições de armazenagem: uma armazenagem desadequada, resultante de fatores como uma secagem insuficiente das colheitas, elevados níveis de humidade ou ventilação insuficiente, cria um ambiente propício ao crescimento de fungos e à produção de micotoxinas;
  • Fatores biológicos: a suscetibilidade genética de culturas à infeção fúngica, a presença de pragas de insetos e a competição com outros micro-organismos podem influenciam o desenvolvimento de micotoxinas;
  • Fatores de stress: culturas sujeitas a condições de stress, como sejam secas e outros fatores climatéricos extremos, infestação por pragas ou danos mecânicos, têm mais propensão para ser colonizadas por fungos e, consequentemente, para ser contaminadas por micotoxinas.


Quais as micotoxinas mais prevalentes

Há centenas de moléculas de micotoxinas identificadas e catalogadas, mas há um grupo de 5 micotoxinas ou famílias de micotoxinas que se têm revelado particularmente importantes para a cadeia produtiva de proteína animal, devido à sua prevalência e toxicidade, sendo por isso alvo de maior atenção pelos riscos que acarretam:

  • Aflatoxinas: produzidas principalmente por Aspergillus flavus e Aspergillus parasiticus, as aflatoxinas são altamente tóxicas e carcinogénicas. São comummente encontradas em culturas como o milho, o amendoim e o algodão;
  • Ocratoxina A: produzida por fungos das espécies Aspergillus e Penicillium, a Ocratoxina A é nefrotóxica e pode ser encontrada em cereais, café, frutos secos e no vinho;
  • Fumonisinas: produzidas por espécies de fungos Fusarium, as fumonisinas encontram-se principalmente no milho e produtos à base de milho, estando associadas a patologias muito diversas, como sejam doenças degenerativas ou edemas pulmonares;
  • Zearalenona: também produzida por fungos Fusarium, a zearalenona imita o estrogénio e pode causar distúrbios reprodutivos nos animais. É mais habitualmente encontrada no milho, trigo e cevada;
  • Tricotecenos: este grupo de micotoxinas, que inclui o deoxinivalenol (DON) e a toxina T-2, é produzido por fungos Fusarium e é especialmente prevalente nos cereais, podendo causar recusa alimentar nos animais, vómitos e imunossupressão.


Fatores que afetam a toxicidade das micotoxinas

A toxicidade das micotoxinas pode ser muito variável e é influenciada por múltiplos fatores, o que significa que, no contexto errado, até uma pequena concentração pode ter efeitos muito prejudiciais na saúde:

  • Tipo de micotoxina: diferentes micotoxinas têm diferentes toxicidades, sendo a sua estrutura química determinante para definir os mecanismos de ação e os níveis de toxicidade;
  • Concentração ou dose: a toxicidade das micotoxinas depende da dose administrada, com maiores concentrações de micotoxinas nos alimentos a resultar em efeitos tóxicos mais severos;
  • Duração da exposição: a exposição aguda a níveis elevados de micotoxinas pode causar efeitos imediatos e graves na saúde, enquanto a exposição crónica a níveis baixos pode resultar em problemas de saúde a longo prazo. A duração da exposição é um fator crítico para determinar o tipo e severidade da reação tóxica;
  • Suscetibilidade da espécie e do sexo: diferentes espécies animais têm diferentes sensibilidades às micotoxinas, o mesmo sendo verdade consoante se trate de machos ou fêmeas. Os humanos também têm diferentes graus de suscetibilidade, dependendo de fatores genéticos e fisiológicos;
  • Idade e fase de desenvolvimento: os animais jovens e as crianças são geralmente mais vulneráveis às micotoxinas, devido à imaturidade dos seus órgãos e sistema imunitário, podendo o impacto das micotoxinas ser especialmente severo nestes grupos;
  • Situação nutricional: deficiências ou desequilíbrios nutricionais podem exacerbar os efeitos tóxicos das micotoxinas, podendo uma nutrição adequada mitigar alguns dos efeitos adversos, fortalecendo o sistema imunitário e os processos de destoxificação;
  • Situação sanitária: pessoas ou animais com uma saúde comprometida, seja por infeções, doenças crónicas ou outras, são mais suscetíveis à toxicidade das micotoxinas;
  • Interações com outras micotoxinas: frequentemente as culturas são contaminadas com múltiplas micotoxinas, podendo as interações entre elas ter efeitos aditivos, antagónicos ou sinérgicos, alterando a toxicidade geral dos alimentos;
  • Fatores genéticos: variações genéticas entre indivíduos podem influenciar o metabolismo e destoxificação das micotoxinas;
  • Condições ambientais e de alojamento: fatores como a temperatura, humidade e a presença de outros micro-organismos podem afetar a estabilidade, concentração e potência tóxica das micotoxinas;
  • Composição dos alimentos: a presença de certos ingredientes nos géneros alimentícios e nas rações para animais podem influenciar a absorção, distribuição, metabolismo e excreção de micotoxinas.

Ao compreender e gerir estes fatores, é possível reduzir o risco da toxicidade das micotoxinas tanto em humanos como nos animais, assegurando uma melhor saúde e produtividade na produção animal e géneros alimentícios mais seguros para o consumo humano.

Impactos na produção animal – micotoxicoses

As micotoxinas têm efeitos diversos e severos na saúde animal, globalmente designados micotoxicoses. Os impactos variam consoante os fatores já identificados, mas podemos agrupá-los em 5 grandes grupos:

  • Redução da ingestão e da eficiência alimentar: as micotoxinas frequentemente causam rejeição alimentar, devido à sua fraca palatabilidade ou aos seus efeitos tóxicos no aparelho digestivo. Isto resulta numa redução da ingestão e na degradação dos índices de conversão, impactando as taxas de crescimento e a produtividade;
  • Imunossupressão: muitas micotoxinas, como as aflatoxinas e tricotecenos, suprimem o sistema imunitário, tornando os animais mais suscetíveis a infeções e doenças, o que aumenta as taxas de morbilidade e mortalidade, bem como os custos veterinários;
  • Distúrbios reprodutivos: micotoxinas como a zearalenona interferem com as hormonas reprodutivas, conduzindo a problemas de fertilidade, abortos espontâneos e menores pesos ao nascimento;
  • Danos em órgãos: as micotoxinas podem causar danos em vários órgãos, como sejam o fígado, os rins, os pulmões ou mesmo o cérebro;
  • Perdas económicas: o impacto global das micotoxinas resulta em perdas económicas significativas, devido à perda de performance dos animais, ao aumento dos custos com cuidados veterinários e à eventual necessidade de eliminar alimentos contaminados. O desenvolvimento de fungos pode igualmente refletir-se na perda de nutrientes e alterações organoléticas dos produtos de origem animal (alterações de sabores, cheiros, cores e consistências anormais), o que reduz o seu valor comercial.

Repercussões na saúde pública

Como já abordámos, as micotoxinas afetam não apenas a saúde animal, mas também apresentam sérios riscos para a saúde humana, decorrentes dos seus efeitos tóxicos e carcinogénicos.

Os consumidores podem estar expostos às micotoxinas através da ingestão de géneros alimentícios de origem vegetal contaminados ou de géneros alimentícios de origem animal obtidos de animais cuja alimentação estava contaminada. A título de exemplo, a Aflatoxina M1, quando presente no leite, permanece estável mesmo quando este é processado por calor ou por fermentação.

Os impactos na saúde pública são em grande medida comparáveis aos impactos na produção animal – danos em órgãos, imunossupressão, atrasos de crescimento, distúrbios reprodutivos, – com custos económicos e sociais que são muitas vezes difíceis de quantificar.

Medidas preventivas para reduzir os efeitos negativos

Uma gestão eficaz das micotoxinas envolve uma combinação de estratégias preventivas, com vista à redução da contaminação fúngica e do desenvolvimento de micotoxinas.
Do ponto de vista da produção primária, estas medidas podem incluir:

  • Boas práticas agrícolas;
    • Rotação e diversificação de culturas, para reduzir as populações de fungos;
    • Utilizar variedades de culturas mais resistentes e garantir que as plantações e colheitas são feitas nos momentos certos;
    • Controlar infestações de pragas para prevenir infeções fúngicas.
  • Boas práticas de higiene;
    • Controlar os acessos às explorações, quer de pessoas, quer de viaturas, assegurando a sua correta higienização;
    • Manter os equipamentos utilizados na produção limpos e higienizados.
  • Condições de armazenamento adequadas;
    • Secar as culturas para níveis seguros de humidade antes do armazenamento;
    • Assegurar a ventilação e usar instalações com temperatura e humidade controladas;
    • Inspecionar regularmente as colheitas armazenadas para sinais de contaminação fúngica.
  • Boas práticas de alimentação.
    • Utilizar alimentos com uma diversidade adequada de matérias-primas, reduzindo o risco específico associado a cada uma delas;
    • Favorecer a utilização de matérias-primas que tradicionalmente apresentam riscos menores de contaminação;
    • Utilizar alimentos que contribuem para o fortalecimento da saúde animal, melhorando a capacidade de os animais combaterem os efeitos adversos das micotoxinas.

Além destas medidas, há um conjunto alargado de ações complementares que podem ser adotadas na indústria de alimentos compostos, com a mesma finalidade de garantir a segurança alimentar:

  • Tanto quanto possível, selecionar fornecedores e origens de matérias-primas que assegurem melhor qualidade dos produtos;
  • Implementar programas de monitorização e testagem regular de culturas, alimentos compostos e produtos de origem animal para a presença de micotoxinas;
  • Incorporar sequestrantes ou adsorventes de micotoxinas nos alimentos para animais, para prevenir a sua absorção no trato intestinal;

  • Manutenção, limpeza e desinfeção adequada de equipamentos, locais de armazenamento e meios de transporte das matérias-primas e alimentos
  • Controlo químico e biológico do desenvolvimento fúngico, através da utilização de fungicidas ou de fungos ou bactérias competidoras, que inibam o crescimento de fungos produtores de micotoxinas;
  • Educar e alertar os agricultores, fabricantes de alimentos compostos, profissionais de saúde animal e consumidores para os riscos das micotoxinas, estratégias eficazes de prevenção e a importância da segurança alimentar.

 

Micotoxinas com utilidade na saúde humana

De forma algo contraintuitiva, há algumas micotoxinas que podem ser utilizadas em proveito da saúde humana, com efeitos muito relevantes.
Destacamos 3 exemplos:

  • Penicilina: descoberta por Alexander Fleming em 1928 e produzida pelo Penicillium chrysogenum, é uma das maiores descobertas de sempre da medicina no combate às infeções bacterianas. Embora existam bactérias que lhe são resistentes, este antibiótico e outros seus derivados químicos são utilizados com sucesso no combate a inúmeras doenças;
  • Cefalosporinas: inicialmente desenvolvidas a partir do fungo Cephalosporum acremonium, descoberto por Giuseppe Brotzu e importante causador de doenças no trigo, a partir de 1946 permitiram a criação de sucessivas gerações de antibióticos, que ainda hoje são de grande importância no combate a bactérias resistentes às penicilinas;
  • Ergotamina: a ergotamina e os alcalóides produzidos pelo esporão do centeio (Claviceps purpurea) são medicamentos utilizados no combate à enxaqueca.

 

Conclusão

As micotoxinas representam uma ameaça significativa à saúde animal, à produtividade e à saúde pública.

Compreender os fatores que promovem o desenvolvimento de micotoxinas, reconhecer as micotoxinas mais prevalentes e reconhecer o seu impacto na produção animal e na saúde humana, é crucial para uma gestão eficaz do problema.
Implementar medidas preventivas abrangentes, incluindo boas práticas agrícolas, armazenagem adequada, uso de sequestrantes e monitorização regular, pode reduzir significativamente os efeitos negativos das micotoxinas.

Através dos esforços combinados de todos os envolvidos – agricultores, cadeias logísticas, produtores pecuários, organismos regulatórios e consumidores – é possível minimizar os impactos das micotoxinas na saúde animal e na saúde humana, assegurando assim uma cadeia alimentar mais segura e sustentável.

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